Trabalhadores, movimentos sociais e sindicais e parlamentares se reuniram, na noite desta terça-feira (3), em um ato em solidariedade aos professores da rede pública do Distrito Federal, em greve por tempo indeterminado. No encontro, que aconteceu no auditório do Sindicato dos Professores do DF (Sinpro-DF), os participantes repudiaram a falta de diálogo com o governo e voltaram a criticar a decisão judicial que aplicou multa milionária ao sindicato e autorizou o corte de ponto dos grevistas.
“Nós exigimos respeito, e esse respeito deve começar com o governo recebendo e dialogando com a nossa categoria”, destacou Márcia Gilda, diretora do Sinpro.
O ato também denunciou a ação truculenta de seguranças da Secretaria de Educação do (SEEDF), que, na manhã de terça, usaram spray de pimenta e impediram o o do advogado do Sinpro, Lucas Mori, durante a ocupação do prédio pelos professores. Segundo Mori, foi necessária a intervenção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para que ele pudesse ingressar na secretaria e fazer a mediação. “Isso tudo contamina o ambiente que deveria ser de busca do diálogo e não desse enfrentamento”, avaliou.
O deputado distrital Gabriel Mango (PT-DF), que esteve presente na ocupação do prédio e articulou um encontro entre o sindicato e a SEEDF, ressaltou que a atual greve se diferencia de outras das quais participou em governos anteriores, pela completa ausência de diálogo. “Em todas as greves houve diálogo e respeito ao movimento sindical, o que não está havendo nesta”, afirmou. “Há uma aliança nefasta entre o poder Executivo, grandes empresários e a alta cúpula do Judiciário para perseguir e calar o movimento sindical e os professores dessa cidade”, acrescentou o parlamentar.

Magno destacou que a bancada de oposição na Câmara Legislativa do DF (CLDF) está em obstrução e impedirá a votação de projetos de lei de interesse do GDF até que o governo abra negociação com o Sinpro.
Já a deputada federal Erika Kokay (PT-DF), ressaltou a tradição de resistência dos educadores do DF e classificou o governo de Ibaneis Rocha (MDB) como antissindical. “Por isso nós estamos enfrentando este governo que não a a educação e a sala de aula onde se constrói a cidadania, defendendo a democracia e o direito de greve, direito assegurado na própria Constituição”, afirmou.
Além de Magno e Kokay, participaram do ato em solidariedade aos professores os distritais Fábio Felix (Psol-DF), Chico Vigilante (PT-DF) e Ricardo Vale (PT), e o federal Reginaldo Veras (PV).
Apoio de movimentos sociais e sindicais
O presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Sérgio Nobre, participou do ato e afirmou que defender greve dos professores do DF diante das ações do GDF e do Judiciário é uma luta de todo o movimento sindical. “Se não, não há direito à greve. O governo fala que há categorias que são essenciais: saúde, educação. Se é essencial, não pode faltar negociação. Se não quer que a greve aconteça, atenda à pauta dos trabalhadores Se achar que uma repressão, uma ameaça econômica vai impedir o povo de lutar, não vai. Porque a gente tem consciência que a nossa luta é justa”, defendeu.
Marco Barato, dirigente do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra no DF e Entorno (MST-DFE), classificou a postura do governo Ibaneis Rocha como “criminalizadora”. “Multar e negar diálogo é a prática que a extrema direita vem atuando frente aos movimentos populares e sindicais. Isso é inadimissível”, avaliou.
Barato defendeu a necessidade de reorganização das frentes de luta e afirmou que o movimento deve servir como base para articular uma candidatura unificada das esquerdas no DF nas próximas eleições. Representantes do Movimento de Trabalhadores Sem Teto (MTST) e do Movimento de Trabalhadores por Direitos (MTD) manifestaram, igualmente, solidariedade à luta dos professores.

Os estudantes da rede pública também saíram em defesa dos professores em greve. “Se o governo não tem compromisso com quem ensina, ele não tem compromisso com quem aprende”, pontuou a presidenta da União dos Estudantes Secundaristas do DF (UESDF), Letícia Rezende.
Ela destacou a precarização das escolas e a dificuldade de diálogo com o governo em relação aos problemas que afetam as escolas. “Está sendo muito difícil falar com o GDF sobre transporte público, teto caindo na cabeça dos estudantes, salário dos professores e várias outras questões que estão precarizadas durante esse governo. Sendo que ele poderia estar colocando o dinheiro usado na construção de viadutos, que não tem um porquê, para os professores”, afirmou a estudante.
O ato foi organizado pela Central Única dos Trabalhadores do DF (CUT-DF). “Discutimos questões que são extremamente importantes, inclusive sobre justiça social, sobre combater o autoritarismo e a escola pública e a educação da classe trabalhadora”, frisou o presidente da entidade, Rodrigo Rodrigues, ao agradecer a participação dos movimentos sociais e indicais.
Falta de negociação
Na decisão judicial que determinou multa diária de R$ 1 milhão ao Sinpro e o corte de ponto dos grevistas, a desembargadora Lucimeire Maria da Silva concordou com a alegação do GDF de que a greve seria “desproporcional” por ter sido deflagrada antes do esgotamento de todas as vias negociais extrajudiciais, o que é contestado pelo Sindicato.
O advogado do Sinpro-DF, Lucas Mori, destacou que a greve foi deflagrada justamente pela ausência de uma mesa de negociação. “A greve busca exatamente forçar o governo a dialogar. Mas não há diálogo, não havia antes da greve e não há agora”, afirmou.
O GDF também alega que a greve tem motivação “exclusivamente financeira” e chegou a afirmar, em resposta ao Brasil de Fato DF, que a mobilização tinha um “viés político-eleitoreiro”, tendo em vista as eleições para a diretoria do Sinpro, realizadas na semana ada.
“Óbvio que tem a pauta salarial, que talvez realmente tenha mais peso nas reivindicações, porque hoje os servidores da educação têm o salário mais baixo das carreiras de nível superior [do GDF]. Mas também temos outros aspectos claramente ilegais que estão sendo cometidos pelo GDF e que estão na pauta de negociação”, argumentou Mori.
Uma dessas pautas é a não regularização do ree ao INSS dos professores temporários, o que prejudica os direitos previdenciários desses trabalhadores. “O DF recolhe, ou seja, o trabalhador tem o desconto no seu salário, paga o INSS, mas o estado não informa quem são pessoas que ele está pagando. E isso para o INSS é como se essas pessoas estivessem desempregadas e sem recolhimento”, explicou o advogado.
“A pessoa está há três, quatro anos como temporário, e chega na hora em que ela precisa de um benefício previdenciário, um auxílio doença, se depara com uma negativa porque ela está desempregada, o que não é verdade. E ela às vezes precisa entrar na justiça, num momento de debilidade, para receber seu salário e garantir a subsistência”, detalhou Mori.
Atualmente, dos 25 mil professores da rede pública do DF, cerca de 17 mil são temporários, o que corresponde a mais de 2/3 dos educadores.
No ano ado, o Sindicato firmou um acordo judicial com o GDF para que o recolhimento fosse regularizado até janeiro de 2024. “Até hoje nada. Então, têm todos esses aspectos que demonstram que a multa [ao Sinpro] é exorbitante”, afirmou o advogado.
O que diz a Secretaria?
Procurada pelo Brasil de Fato DF, a SEEDF lamentou a ocupação da entrada do edifício onde funciona a sede da SEEDF, no Shopping ID. “Embora a Secretaria reconheça o direito constitucional à livre manifestação, lamenta que a conduta adotada tenha comprometido o funcionamento da unidade, prejudicando o atendimento à população e a rotina de trabalho dos servidores”, afirmou em nota.
A Secretaria também informou que, além da decisão judicial que determinou a imediata suspensão da greve, autorizou o corte do ponto dos grevistas e fixou multa diária de R$ 1 milhão ao Sinpro, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) também indeferiu novo pedido do sindicato que buscava impedir o corte do ponto. O Sindicato foi intimado a comunicar aos filiados o teor da decisão judicial, que foi publicada no site da entidade.
“Caso o movimento grevista seja mantido, o Sinpro-DF assume, de forma autônoma, as responsabilidades legais decorrentes do descumprimento da ordem judicial”, afirmou a pasta.