A Rede Escola Pública e Universidade (Repu) recomendou que o afastamento de 25 diretores da rede municipal de ensino em São Paulo seja cancelado de “imediato” pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB).
Por meio de uma nota técnica, a rede declarou que o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) e o Índice de Desenvolvimento da Educação Paulistana (Idep), utilizados para a seleção dos diretores, oferecem “informações limitadas” sobre a qualidade de ensino e não devem ser lidos isoladamente, “sob o risco da geração de incentivos perversos que minam a eficácia dos indicadores como instrumentos para o fortalecimento das políticas educacionais”.
A Secretaria Municipal de Educação (SME) usou esses índices para convocar os 25 diretores para um curso de formação. Na prática, a convocação implica no afastamento dos servidores sem o devido processo legal, uma vez que a formação é de 1.770 horas, o que corresponde a nove horas diárias até o final do ano, carga horária que inviabiliza a direção das escolas. Nesta quinta-feira (29), a prefeitura recuou sobre o formato do curso, que agora será debatido com os profissionais convocados.
No documento, a rede, criada por professores e pesquisadores de universidades públicas do estado de São Paulo afirma que “o Ideb por escola não é medida confiável para fazer comparações de desempenho entre unidades escolares com distintos contextos de vulnerabilidade social”, que impactam nas notas alcançadas nesses índices.
Na mesma linha, um estudo deste ano do Instituto Cultiva, que analisou o resultado do Ideb de escolas de São Paulo entre 2019 e 2021, reforça a conclusão de que existem distorções causadas pelo índice. “Os dados analisados demonstram que o baixo desempenho educacional em territórios vulneráveis é resultado de um conjunto complexo de fatores que transcendem a gestão escolar, incluindo desigualdades estruturais, violência urbana, falta de o a serviços básicos e condições socioeconômicas das famílias”, explica o cientista político e presidente do instituto, Rudá Ricci.
De acordo com a pesquisa, áreas vulnerabilizadas têm desafios específicos, como presença de imigrantes, infraestrutura insuficiente, ausência de serviços básicos e violência urbana. Isso explica porque o desempenho escolar está segregado espacialmente: distritos mais ricos como Mooca, Carrão, Butantã, Perdizes e Parque São Domingos têm mais escolas entre as melhores pontuações, enquanto distritos como Vila Prudente, Vila Medeiros, Vila Curuçá, Pedreira, Lajeado e Cidade Tiradentes apresentam somente unidades escolares com as piores avaliações.
Arbitrariedade e falta de consistência
Ainda na nota técnica, a Repu também classificou a medida como um caso de “arbitrariedade e falta de consistência” e apontou para “a aparente falta de preparo técnico das equipes da SME para a lidar com indicadores educacionais que deveriam ser analisados sempre de forma contextualizada”.
O grupo de professores e pesquisadores ainda alertou para a imprecisão causada ao mesclar dados de dois índices diferentes. “É temerário que indicadores com métricas distintas sejam utilizados ao mesmo tempo para tomar uma decisão que afeta escolas diferentes em uma única rede de ensino”, diz outro trecho da nota técnica. A utilização de métricas distintas é “inaceitável”.
Ao Brasil de Fato, a SME informou que utilizou o Idep para as escolas que não tiveram o índice nacional divulgado, devido à participação inferior a 80% dos estudantes nas provas aplicadas. Das 25 unidades, 16 foram escolhidas com base nos índices dos anos iniciais – do primeiro ao quinto ano –, sendo 11 pelo Ideb e 5 pelo Idep 2023. As outras nove escolas foram selecionadas com base nos índices dos anos finais – do sexto ao nono ano –, sendo uma pelo Ideb e oito pelo Idep 2023.