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O Estrangeiro

Europa escolhe Rússia como vilã para justificar rearmamento bilionário, diz analista

Para Marcos Fernandes, movimento é preocupante e lembra proximidade com a Segunda Guerra Mundial (1939-1945)

O analista político Marco Fernandes acredita que a escalada militar da Europa diante da guerra na Ucrânia tem um objetivo estratégico: sustentar investimentos bilionários na indústria bélica sob a justificativa de uma suposta ameaça russa. Em entrevista ao podcast O Estrangeiro, do Brasil de Fato, ele aponta que, apesar da clara desvantagem militar da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) frente à Rússia, reconhecida até por lideranças da aliança, o continente aposta na reindustrialização por meio da economia de guerra.

“A desvantagem da Otan é abissal nesse momento”, destaca Fernandes. Como contrapartida, a Europa trabalha em uma guinada militar. Como exemplo, ele cita o pacote de 500 bilhões de euros proposto por Friedrich Merz, novo chanceler da Alemanha, para rearmar o país ao longo da próxima década. A proposta foi negociada com o Partido Social-Democrata (SPD), da coalizão governista, que em troca exigiu um investimento de 400 bilhões de euros em infraestrutura. Isso resultou, na prática, em um plano de quase 1 trilhão de euros.

“Como é que você sustenta o custo político para dizer: ‘Precisamos de 500 bilhões de euros em armas’? Dizendo: ‘A Rússia vai nos invadir, a Rússia ameaça a nossa existência’. Então, acho que isso vai continuar”, explica. Para o analista, o discurso belicoso não só garante respaldo político interno, como também impulsiona a reindustrialização europeia em moldes militares.

Fernandes alerta que o retorno da Alemanha a uma posição de potência armamentista é um sinal preocupante. “Isso é terrível para o mundo, porque nós vamos ter mais armas, mais tensões. Não tem quem, a essa altura do campeonato, não fique arrepiado de pensar o que é uma Alemanha de novo com uma indústria bélica, um armamento, um arsenal bélico gigantesco. Sabemos que da última vez que isso aconteceu, quase acabou o mundo, que foi na Segunda Guerra Mundial. A memória não é nada promissora.”

EUA priorizam Ásia e veem guerra na Ucrânia sem fim próximo

Marco Fernandes destaca que os Estados Unidos estão priorizando o Indo-Pacífico diante de um “potencial conflito catastrófico na região”, o que faz com que seja necessário “parar de perder tempo com a Rússia” e focar no desafio da China. Essa mudança estratégica indica que a guerra na Ucrânia não terá um encerramento rápido, pois “metade do governo [do ex-presidente dos EUA, Joe] Biden já tinha um grupo de republicanos que falava publicamente que a guerra contra a Rússia era uma perda de tempo”.

Sobre a possibilidade de entrada da Ucrânia na Otan, Fernandes é enfático: “não tem a mínima chance, pelo menos não com essa istração do [presidente dos EUA, Donald] Trump”, já que isso “significa um conflito generalizado com a Rússia”. Também entrevistado no podcast, o correspondente do Brasil de Fato na Rússia, Serguei Monin, complementa que essa questão é um dos principais imes nas negociações, pois “só tem segurança se a Otan não se expandir para a Rússia”, dificultando um cessar-fogo imediato e uma resolução pacífica.

Rússia e Ucrânia retomam diálogo, mas ime trava cessar-fogo

Serguei Monin destaca como um avanço positivo a reunião direta entre representantes da Rússia e da Ucrânia pela primeira vez desde março de 2022. Para ele, esse “primeiro avanço positivo” abre margem para discutir os próximos os, mesmo sem avanços concretos na implementação do cessar-fogo. No entanto, as negociações esbarram na resistência da Rússia, que defende que “primeiro tem que sentar e definir os termos desse cessar-fogo para que seja duradouro”.

A relação da Ucrânia com a Otan é um ponto central no ime, pois a Rússia considera a expansão da aliança uma importante ameaça. Além disso, no campo de batalha, Moscou vem obtendo ganhos, o que reduz seu interesse em um cessar-fogo imediato. Serguei observa que “a Rússia está ganhando a guerra” e que “um cessar-fogo imediato pode ser encarado como um momento para rearmamento” do lado ucraniano.

Conflito afeta economia da Europa, Rússia e Brasil

O analista Marco Fernandes aponta que a Europa enfrenta consequências econômicas severas, com a alta do preço da energia e a desindustrialização, enquanto líderes como Angela Merkel, ex-chanceler da Alemanha, e Emmanuel Macron, presidente da França, defendem o rearmamento, justificando o desmonte do Estado de Bem-Estar Social. Segundo ele, “a Europa continua nessa toada meio suicida” ao insistir em mais sanções contra a Rússia, mesmo com dificuldades internas e riscos para a estabilidade.

Do lado russo, Fernandes destaca que as sanções não foram decisivas para derrotar Moscou, e que a economia de guerra gerou crescimento. Ele dá como exemplo o Produto Interno Bruto (PIB) como poder de paridade de compra, que saltou 7,6% no país em 2024. Para o Brasil, o analista alerta que quase 70% do diesel e mais de 80% dos fertilizantes vêm da Rússia, revelando uma forte dependência e exposição a riscos que impactam a economia nacional.

O podcast O Estrangeiro vai ao ar toda quarta-feira às 11 horas no Spotify e YouTube.

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