O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) retomou a ocupação de um trecho da Estrada de Ferro Carajás, no município de Parauapebas (PA), operada pela mineradora Vale e via de escoamento de minérios extraídos pela empresa. A área já havia sido ocupada pelo movimento em dezembro de 2024.
Os cerca de 6 mil militantes chegaram no local por volta das 5h desta quinta-feira (22) e, de acordo com uma porta-voz do movimento, não têm prazo para sair.
A ocupação é organizada na região de o ao acampamento Terra e Liberdade, o maior do MST, com 8.250 famílias cadastradas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Mesmo sem a regularização da terra, os moradores cultivam diversos alimentos, como milho, mandioca, frutas e hortaliças.
Além da criação do assentamento, o movimento tem outras solicitações. “É um conjunto de atendimentos que a gente está colocando”, diz Viviane Brígida, que integra a coordenação estadual do MST no Pará.
O MST pede a criação de outros assentamentos na região e a implementação de ações relativas à reforma agrária e aos direitos dos povos do campo, como vistoria de terras e investimento as famílias assentadas.
“Também foi demandado, dentro da pauta acordos e parcerias, que houvesse destinação de políticas públicas para os territórios e para as famílias dos assentamentos e acampamentos do movimento. Então, é uma longa pauta”, informa a coordenadora.
Em dezembro de 2024, o MST bloqueou a ferrovia e tinha, entre as reivindicações, o pagamento da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM) e outros tributos, que, segundo o Tribunal de Contas da União (TCU), teriam sido sonegados pela mineradora. O montante deveria ser destinados aos cofres públicos de municípios atingidos direta ou indiretamente pelas atividades da empresa.
“Após 5 meses sem retorno, sem nenhuma demanda atendida, os trabalhadores voltam a uma jornada de lutas por seus direitos, e reivindicando as principais pautas de desapropriação e assentamentos das famílias na região”, ressalta Brígida.
Agora, os militantes reivindicam que a Vale estabeleça acordo de cooperação técnica junto ao Incra e ao Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) para viabilizar as políticas públicas que irão atender aos trabalhadores rurais.
As duas ocupações da Estrada de Ferro Carajás fazem parte ‘Jornada de Luta por Direitos e Reforma Agrária Popular’, que reúne ações pela reforma agrária. Além de ficar perto do maior acampamento do MST e também do assentamento Palmares, o ponto é estratégico no trabalho da Vale, empresa alvo de parte das reivindicações do movimento.
“É um ponto extremamente estratégico do ponto de vista da logística de transporte do minério dessa região toda de Carajás até o Porto da Madeira, em São Luís do Maranhão, por onde sai o minério do Brasil”, informa Jorge Neri, liderança do MST no Pará.
Considerada a maior arrecadadora do país no ramo da mineração, a Vale acumula impactos socioambientais, como as tragédias de Mariana, em 2015, e Brumadinho, em 2019, em Minas Gerais. O rompimento de barragens de rejeitos resultou em mortes, contaminação de rios e outros danos ambientais que, ainda hoje, prejudicam moradores de diversas áreas afetadas.
Em reposta ao Brasil de Fato, o Incra informa que acompanha a mobilização e deve realizar uma reunião nesta sexta-feira (23) para tratar do tema.
Minério, grãos e ageiros
Com 979 quilômetros, a Estrada de Ferro Carajás interliga a Serra dos Carajás, no Pará, ao porto de Ponta Madeira, em São Luís, no Maranhão. Com a manifestação do MST, o tráfego está temporariamente interrompido.
Segundo informações da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), a ferrovia é substancialmente utilizada para o escoamento dos minérios extraídos e beneficiados pela Vale provenientes das suas próprias minas. A ferrovia também efetua transportes de minério de ferro, pelotas e outras cargas para terceiros, como grãos, veículos e combustíveis. Além disso, a Estrada de Ferro Carajás é via de transporte de ageiros.
Em nota encaminhada ao Brasil de Fato, a empresa informa que a circulação do trem de ageiros está cancelada nesta quinta-feira, no sentido de São Luís (MA) para Parauapebas (PA), e seguirá suspensa nesta sexta-feira, de Parauapebas para São Luís, “por questão de segurança, devido à interdição da Estrada de Ferro Carajás por integrantes Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) do Pará nesta madrugada”.
“A Vale respeita o legítimo e pacífico direito à manifestação e repudia qualquer ato que impeça o direito das pessoas ou empresas de desempenharem suas atividades e, sobretudo, que ameace a segurança e o direito de ir e vir. A empresa adotará todas medidas cabíveis para a liberação imediata e segura da linha”, informa a nota.
De acordo com o comunicado, a empresa reafirma seu compromisso com o Acordo de Cooperação Técnica (ACT), assinado, em abril deste ano, com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), para implementar ações conjuntas para contribuir com a regularização fundiária e a reforma agrária no Pará.
A empresa informa ainda que os ageiros podem remarcar o bilhete ou pedir o reembolso do valor investido na compra da agem no prazo de até 30 dias. Mais informações sobre reembolso ou remarcação podem ser obtidas no Alô Vale (0800 285 7000).
O Brasil de Fato questionou a Vale sobre o pagamento do CFEM e outros tributos, mas não teve resposta.